Empatia com o medo do outro

Por Carolina Cunha

Por muito tempo venho lidando com uma aflição no peito ao ser demandada para apresentação de trabalhos ou qualquer outra coisa que envolva falar em público. Diante da pergunta, a mão transpira, o coração dispara, os pensamentos negativos vêm à tona. “Não vou conseguir”, penso.

Meu nome é Carolina Cunha, tenho 25 anos, sou estudante de jornalismo no Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH) e estou no meu último período do curso . Para início de conversa, passei por toda a fase da escola e da graduação,  até então, sem conseguir apresentar um trabalho quando isso envolvia estar à frente de muita gente. Normalmente, para quem enfrenta o medo de falar em público, “muita gente” às vezes significa um total de seis pessoas, o suficiente para proporcionar um bloqueio.

Esse bloqueio está associado a vários aspectos. No meu caso, principalmente, à ansiedade. Por isso, quando um desafio é proposto, o anseio para saber como tudo vai acontecer é muito forte.  Muitos questionamentos saltam na mente: “e se der errado?”, “e se eu esquecer”?  Além disso, desde criança cresci ouvindo da neurologia que tenho TDAH, popularmente conhecido como   déficit de atenção. Hoje em dia, na terapia, consigo, de fato, enxergar algumas características.

Tenho dificuldade de armazenar informações; a leitura para mim é complicada, pois muitas vezes leio e não consigo lembrar e, com isso, ao ser desafiada a falar para muita gente, vem a insegurança, o medo de esquecer, de errar e, sobretudo, o medo do julgamento do outro. Em virtude  de todos esses desafios,  me sinto incapaz de realizar tarefas simples e complexas do dia a dia. Por empatia, por sentir que outras pessoas passam pelo mesmo, resolvi ir atrás de especialistas que entendem melhor o que pode levar a quadros como esse.

Deborah Agapito, psicóloga especialista em terapia cognitivo-comportamental, explica que o medo de falar em público pode vir na forma de  pensamentos ansiosos, negativos e com preocupação a respeito do que o público pensará sobre o que está sendo dito; medo de julgamento; medo de não agradar ou de não conseguir falar.

Não se trata apenas sobre falar na frente de multidões, diz ela. Isso pode acontecer simplesmente ao falar com alguém específico. Para que isso não cause impacto na qualidade de vida, a psicóloga recomenda buscar um profissional para avaliar o medo de falar em público, ou seja, se pode advir de pensamentos ansiosos ou de uma patologia. Assim, é possível dar seguimento ao tratamento recomendado.

Segundo a Deborah, esse medo se trata de um estado emocional causado pela ansiedade, insegurança e a tensão nervosa, que se origina na falta de autoconfiança. No caso de crianças e adolescentes, esse medo pode impactar na dificuldade de socialização e de construção de vínculos, diminuição da autoestima e sensação de desvalor. “Para os pais que possuem filhos com essas dificuldades, a maneira de ajudá-los é a incentivar com hábitos de comunicação oral, como atividades grupais de teatro e esportes”, descreve.

A psicóloga também destaca alguns pontos no ambiente escolar, como a importância de os professores trabalharem a estimulação da expressão em público dos alunos por meio de dinâmicas e jogos em grupo. Essas medidas buscam a diminuição ou superação da timidez, a melhoria da autoestima e a construção da autoconfiança.

Quando o aluno chega na escola, durante a fase da adolescência, já com o medo de falar em público, cabe aos educadores o exercício frequente da oralidade e da critica construtiva, ressaltando os pontos positivos das apresentações em público e orientando para que os pequenos erros sejam corrigidos. A psicóloga ressalta, ainda, que as correções nunca devem serem feitas na frente de toda a sala, mas sim, diretamente com o aluno, evitando possível exposição negativa frente aos colegas de turma.

 “Pela interferência do TDAH na aquisição e no desenvolvimento da linguagem, é frequente a ocorrência de troca de letras/sílabas/partes de palavras e problemas na sequenciação de narrativas. É comum ocorrer também os esquecimentos, comumente chamados de “brancos” de memória, tudo isso contribuindo para dificultar a comunicação e a performance global do indivíduo.  Visando melhorar esse quadro e estimular a comunicação em público, sugere-se um tratamento combinado entre: medicação (quando recomendado por um psiquiatra), psicoterapia com um profissional da psicologia e intervenção com um fonoaudiólogo, visando aprimorar as habilidades comunicativas, como a organização do discurso e a ampliação do repertório linguístico”, afirma a especialista.

Déborah Agapito também explica que falar em público de forma calma e segura não é um comportamento natural, mas sim uma construção. Existem algumas técnicas no dia a dia para enfrentar o medo,  como construir diariamente sua habilidade de comunicação por meio de alguns passos: treinar a escuta de sua própria voz (buscando uma voz sem falha ou engasgos, o que reflete em uma comunicação mais segura); observar sua postura (costas curvadas passam uma impressão de descuido, enquanto a postura ereta indica uma pessoa segura); exercícios de respiração (enquanto a respiração curta e rápida alimenta a ansiedade, uma respiração lenta e profunda gera relaxamento muscular, o que permite uma comunicação fluida).

Jornal Daqui BH

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