Por Ana Carolina Sousa, Tassio Santos e Thainá Alves 

Assim como a família, o espaço escolar contribui para a formação de crianças e jovens. É nele que os indivíduos são apresentados à cidadania e aprendem sobre diversidade, culturas, costumes e crenças. Compreender e desenvolver a chamada educação antirracista, portanto, é fundamental para que todos tenham sua identidade e sua história reconhecida.

O racismo continua presente em todas as esferas da sociedade e precisa ser desconstruído, inclusive na escola. A Lei 10.639/03, modificada pela Lei 11.645/08, tornou obrigatório o estudo de história e cultura afro-brasileira e indígena nas redes públicas e particulares de todo o país. Porém, na prática, apenas no mês de novembro, ou, especificamente, no dia 20 de novembro, é que a descriminação racial, a escravidão e as culturas africana e afrobrasileira ganham destaque no ambiente escolar.

Ao pensar nisso, entrevistamos a professora e mestre em Educação Tecnológica pelo Centro Federal de Minas Gerais (CEFET-MG), Gleice Emerick e a psicóloga, orientadora parental e facilitadora do programa “Encorajando pais”, Silvana Francisca. O intuito da nossa conversa foi entender a importância da educação antirracista e o impacto do racismo na vida dos sujeitos.

Confira, primeiramente, o bate-papo com a pedagoga Gleice Emerick.

Foto: Gleice Emerick/Arquivo pessoal.

 

DaquiBH: Para você, o que significa falar em educação antirracista?

Gleice Emerick: A educação antirracista é mais do que trabalhar a questão da negritude. É compreender os sujeitos como pessoas com direito, ou seja, seres humanos, com direitos iguais e acessos iguais, que desfrutam dos mesmos direitos e deveres. A educação antirracista, antes de tratar o preconceito em si, deve enfatizar o valor da vida humana, aquilo que nos faz humano, que nos diferencia dos demais animais. Acredito que esse princípio seja o mais importante. Depois, pode-se fazer um trabalho continuado, sistematizado e cotidiano. Não se trata de uma vez ou outra, ou de trazer à baila esse assunto quando acontecer algo com visibilidade nacional. Ao contrário, é preciso combater, no cotidiano, de forma muito focada, todo e qualquer tipo de preconceito, inclusive o racial. Somos afetados de forma mais contundente pela questão racial.

DaquiBH: Tendo em vista que na escola o contato com a diversidade oportuniza as relações humanas, qual o papel do educador?

Gleice Emerick: A função do professor, na verdade, é ensinar o aluno a enxergar aquilo que, no primeiro momento, não está tão visível. Aprender a ver aquilo – ou a ler o que está nas entrelinhas. É um processo de aprendizagem intencional. Acredito que o professor deve focar nessa aprendizagem. É preciso desnaturalizar aquilo que, nos preconceitos, já está naturalizado por nós, como usar termos como “denegrir”: “Fulano de tal está denegrindo a minha imagem”; “Ah, você tem um cabelo assim, assado”. São padrões e linguagens que fazem parte de nosso cotidiano, e já estão naturalizados. Portanto, a gente não vê problema em usar essas expressões. É importante que o professor problematize, e ensine o aluno de onde vem essas expressões, de onde nasceram. É importante que o professor reflita, apresente dados – inclusive, estatísticos – para mostrar ao aluno os efeitos dos preconceitos, principalmente, o racial. O professor deve apresentar músicas, as problemáticas que, de fato, são vivenciadas, principalmente nas escolas públicas, onde há maior contingente de alunos negros. Eles têm experiência, vivenciam isso na pele, ao entrar no shopping, em um ambiente marcadamente frequentado por pessoas brancas. A problematização, a reflexão, a crítica e a denúncia seriam os papéis fundamentais do professor.

DaquiBH: A escola é o lugar onde a criança deverá encontrar os meios de se preparar para realizar seus projetos de vida. Somado a isso, é nesse espaço que o respeito, a empatia e a solidariedade devem ser compreendidos e exercidos. Qual a importância de reproduzir essas questões dentro da sala de aula e de qual forma ela deve ser aplicada para um entendimento mais efetivo?

Gleice Emerick: Essa pergunta é no mínimo instigante. Primeiramente, precisa-se pensar se a escola é o lugar onde as crianças podem realizar seus projetos de vida ou se preparar para a realização deles. Acredito que a escola estaria alcançando plenamente a sua função. Quero problematizar essa questão, pois acredito que as escolas, sobretudo o ensino fundamental dois e o ensino médio, têm deixado a desejar no processo voltado para a construção dos planos de vida. O professor deve trabalhar com os alunos situações práticas que envolvam as questões de solidariedade, de colaboração, de empatia e de respeito. Em alguns momentos, apresentar situações reais, problemas e desafios que eles terão que se organizar para intervir e levar ajuda na comunidade ou instituição. É qualquer preconceito que possa emergir na sala de aula ou em outros espaços, como no recreio e banheiro. É importante que esses assuntos sejam apresentados para que todos tenham conhecimento e possam opinar a respeito, inclusive, propor sugestões e formas de intervenção. Como que o aluno acha que deve ser tratada essa situação? Qual tipo de abordagem que deve ser dada?. O aluno que praticou algum tipo de desrespeito ou agiu com preconceito, tenho a experiência deles próprios proporem. Primeiro, um pedido formal de desculpa. Se o fato foi realizado de forma individual, a desculpa deve ser somente para a pessoa desrespeitada, mas, caso tenha ocorrido perto de outras pessoas, o perdão será no coletivo, ou seja, diante de toda a turma. Além disso, os alunos propõem trabalhos com a temática e, o agressor pesquisa, elabora cartaz e apresenta para a classe. Sendo assim, uma forma educativa de tratar essa situação de preconceito.

DaquiBH: Em se tratando de educação antirracista dentro das escolas, além da construção e elaboração de atividades que promovam o conhecimento do aluno, quais seriam, na sua opinião, outras formas de promover a educação antirracista nesse espaço?

Gleice Emerick: Na verdade, enquanto tenho o tema educação antirracista, significa que tenho racismo. Somente quando tiver na perspectiva que todos os sujeitos, independentemente da sua condição social, cor da pele e crenças, são sujeitos de direitos iguais, eu não vou precisar tratar a educação antirracista. Por quê? Porque estarei numa sociedade que a pessoa tem um valor pelo que ela é. O termo educação antirracista, de certa, denuncia. Ele demonstra que nós temos uma sociedade preconceituosa. Como respondi anteriormente, fazemos isso, trabalhando de forma sistemática, continuada, aprofundada e no cotidiano. Ou seja, estar sempre problematizando essas situações e desnaturalizando os preconceitos que trazemos em nós.

DaquiBH: Muitos estudos demonstram o quanto o racismo está presente nas instituições de ensino. Um grande exemplo disso é a ausência de personagens pretos presentes nos livros didáticos. Você acredita que promover a inserção de literatura com protagonismo de personagens negros como super-heróis, príncipes e princesas é um caminho para a educação antirracista?  Qual é a sua interpretação sobre essa vertente?

Gleice Emerick: Sim. Acredito que todos os espaços de mídia, não só o livro didático, mas o jornalismo e as pessoas, devem ter acesso e visibilidade, independentemente da cor. Os livros didáticos, na verdade, há um bom tempo, estão sendo reelaborados, passando por uma análise mais aprofundada. Quando não havia essa análise, era muito comum ver vários estereótipos voltados para o negro. Hoje, percebe-se um certo cuidado nesse contexto. A mídia também já traz essa preocupação, não da forma como deveria, mas é um avanço, não podemos deixar de pensar nisso. Além disso, é muito importante a gente superar, pensar também nos estereótipos de beleza. Os livros didáticos, a escola, tem essa função de trabalhar a beleza. O seu conceito, suas diversas manifestações, as diversas formas de concebê-la, a subjetividade, tudo isso, deve ser considerado. Mas, sim, acredito que esses personagens negros devem ser cada vez mais visíveis.

DaquiBH: As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana de 2004, que tem como objetivo corrigir injustiças, eliminar discriminações e promover a inclusão social e a cidadania para todos no sistema educacional brasileiro, de certa forma, foram um avanço, mas você acredita que essas diretrizes são suficientes para combater o racismo dentro das escolas? Quais outras medidas seriam viáveis?

Gleice Emerick: Na verdade, não é por ausência de lei que temos problemas dessa ordem no país. Quando se pega a constituição, a lei de diretrizes e bases da educação, os parâmetros nacionais, as diretrizes nacionais para a educação básica, o plano nacional de educação e a BNCC (Base Nacional Comum Curricular), todas elas trazem uma preocupação com a questão das relações étnico-raciais. Embora o documento seja um primor e junto às diretrizes nacionais, temos uma gama de materiais que foram elaborados pelo mesmo grupo, ele, por si só, não modifica uma cultura. O que modifica a cultura são as pessoas e não a lei. Ela é importante para assegurar direitos, mas a concepção, a forma como se vê a vida, quem muda somos nós. Precisamos aliar a lei, uma mudança de concepção da forma como percebemos essas diferenças e diversidade, tratando-a como um elemento de ganho e qualidade.

DaquiBH: A educação pode ser entendida como uma ação cooperada, na qual professores e demais profissionais de educação, juntamente com a participação e incentivo dos pais, possam contribuir para o desenvolvimento das crianças. Qual é sua interpretação sobre a participação da família na educação antirracista?

Gleice Emerick: Na minha opinião, acredito que o foco principal da escola deve ser as crianças, e elas, por sua vez, levarem o debate sobre educação antirracista para as famílias. Podemos até realizar eventos voltados para esse fim e mobilizar, mas são momentos. No dia a dia, de forma mais amiúde, o papel deve ser da própria criança. Com isso, não estou diminuindo a importância da família no processo, mas ninguém pode ter a ilusão que vamos alcançar todas as famílias. Por isso, o foco é a criança e o adolescente. Porque é o sujeito que tenho diante de mim, diariamente, e terei acesso. Preciso trabalhar cada vez mais aprimorada com eles, assim, a família será alcançada por meio dos filhos e da participação nos eventos.

DaquiBH: De que forma o letramento racial pode ajudar na educação antirracista?

Gleice Emerick: Acredito que se pode colocar letramento racial e usar outra terminologia, mas, se as pessoas não compreenderem e os professores que estiverem trabalhando forem preconceituosos, de nada adiantará. O problema está no interior das pessoas, na forma como se veem. O que acho de importante no letramento racial, é que estaria construindo uma cultura de valorização, principalmente, das características negras, que, geralmente, são deixadas em segundo plano, se comparadas com as das pessoas brancas. Pois as características do branco sempre são colocadas em situação de maior relevância e destaque. Logo, a criança precisa olhar para sua negritude e se achar bonita, achar os seus traços, identificar uma determinada etnia, a importância dessa identidade de etnia, assim também, como a criança branca. Ou seja, não podemos, também, pensar em um mundo polarizado, negro, indígena ou branco. Temos que pensar na perspectiva de um mundo aproximado, onde há uma troca dessas diversas culturas, biotipos e formas de ver o mundo. Tudo aquilo que reforça o preconceito, a princípio, eu sou contra. Acredito que a gente precisa falar, se colocar. Mas, mais do que isso, por exemplo, falar sobre antirracismo pra mim é algo normal do cotidiano. Por quê? Porque não consigo compreender como uma pessoa pode ser excluída por causa da cor da sua pele. Mas essa é uma concepção minha. Se uma outra pessoa tem uma concepção diferente, provavelmente, ela vai falar sobre o preconceito quando tiver um projeto específico. Assim, mais importante do que esse letramento, é a concepção que os professores possuem sobre a educação antirracista, e não só na teoria. Dado que, se perguntar teoricamente, todos responderão, com certeza, palavras bonitas, bem formuladas, frases acabadas, mas, queremos pensar nisso no cotidiano, na capacidade de se indignar com os preconceitos que vemos no dia a dia.

Agora, confira a conversa com a psicóloga clínica Silvana Francisca.

 

DaquiBH: Silvana, por que falar de educação antirracista na infância?

Silvana Francisca: A infância é o momento, por excelência, dos principais aprendizados e de desenvolvimento do sistema de crenças para a vida. Aprender sobre o valor das diferenças entre as pessoas e construir um olhar crítico e amoroso sobre as relações que desenvolvemos no cotidiano, já na infância, contribui para a formação de crenças positivas sobre as pessoas negras e para um posicionamento ativo diante de situações que reproduzam o racismo.

 

DaquiBH: Quais são os principais impactos que a violência racial pode trazer para a criança? Esses impactos podem desencadear problemas para a vida adulta?

Silvana Francisca: Os acontecimentos na vida de uma criança têm um efeito importante sobre a formação de sua personalidade e seu modo de agir no mundo. Assim, as experiências que são permeadas por violência racial, que, inúmeras vezes, são naturalizadas nos diversos meios em que a criança transita (escola, família ou em interações sociais), tem o potencial de produzir uma visão negativa sobre si, levando a sentimentos de desvalor, inferioridade, baixa autoestima, incapacidade, estado de alerta constante, culminando, inclusive, em transtornos como ansiedade, depressão ou uso abusivo de substâncias.

As marcas desta infância ou adolescência na vida adulta serão inegáveis, como quando pensamos que o que somos hoje depende do que foi construído deste o início da vida. O tempo de construção de sonhos e projetos para a vida foi tomado pela necessidade de autoproteção contra a violência. Tal adulto terá enorme dificuldade em perceber o seu real potencial de realização e posicionamento no mundo.

DaquiBH: Na sua opinião, como os psicólogos educacionais devem trabalhar com o racismo e as relações raciais dentro das escolas?

Silvana Francisca: O principal recurso nas escolas são os educadores, e educadores são todos que têm uma função de transmissão de ensinamentos para as crianças. É fundamental que se olhe para a percepção e sentimentos daqueles que educam, e como se colocam diante desta questão. O psicólogo na escola precisa atuar em parceria com os agentes escolares e desenvolver estratégias para questionamento e desconstrução dos pensamentos e fazeres que reproduzem o racismo, chamando a família para integrar as ações e mobilizações a partir da realidade vivenciada.

DaquiBH: O papel da escola é essencial para a educação antirracista, mas como os pais devem abordar a questão do racismo em casa de forma que a criança compreenda?

Silvana Francisca: Tudo o que não é falado, não é questionado e se fortalece como uma verdade. Falar sobre racismo, como qualquer ensinamento, a uma criança, não precisa ser algo imposto, mas pode-se atentar para os sinais que são dados no seu dia-a-dia, ou os questionamentos sobre o assunto. Provocar o assunto a partir de perguntas sobre os colegas, as brincadeiras na escola e seus sentimentos nas interações trará oportunidades de falar sobre isto.

Outro ponto importante é introduzir leituras, brincadeiras, filmes e outros recursos, nas práticas familiares, que valorizem a formação do povo brasileiro, apresentando este conhecimento sob o olhar de pessoas pretas, numa posição afirmativa, valorando suas forças e potencialidades. Hoje temos uma importante bibliografia infantil que contempla personagens negros, com conteúdo escrito por pessoas negras a partir da proposta de ações afirmativas. Como exemplo cito as obras: Minha Mãe é Negra sim, Meu Crespo é de Rainha, O Pequeno Príncipe Preto, Sinto o que Sinto: e a Incrível História de Asta e Jaser, Vovó Nanã Vai à Escola, entre outros.

DaquiBH: Quais são as formas mais saudáveis de enfrentamento do racismo nas escolas?

Silvana Francisca: Toda ação afirmativa precisa ser pensada a partir do respeito mútuo, dos aprendizados possíveis e da não reprodução das atitudes racistas ou violentas. A conscientização sobre o racismo estrutural prepara o campo para pensar em posicionamentos assertivos, sabendo que nenhum de nós está imune a algum nível de reprodução do racismo por estarmos inseridos nesta malha. A violência não pode ser combatida efetivamente com outras violências, mas a partir da responsabilização consciente dos atores ou responsáveis. Considerando a infância como um período de construção do pensamento, é fundamental que a escola promova ações educativas e de sensibilização das crianças e famílias diante de situações que validam o racismo, inserindo a pauta em seu projeto pedagógico anual.

DaquiBH: Como identificar o racismo velado dentro do ambiente escolar?

Silvana Francisca: Para desvelar o racismo nas relações é fundamental que seja aprendido e falado sobre sua construção ao longo da história da sociedade. É preciso estar atento aos sentimentos gerados a partir das diversas situações, explícitas ou não, que reforcem aspectos negativos e de inferioridade, diante de outras pessoas. Mostrar que existe o racismo sim, e falar sobre o mito da democracia racial, que tenta camuflar a realidade vivida. Invalidar ou minimizar os sentimentos diante destas situações caracteriza uma forma que legitima o racismo, contribuindo para a alienação do conhecimento que promove a transformação social.

DaquiBH: Você acredita que o racismo pode provocar o mal desempenho do aluno? Se sim, quais medidas devem ser tomadas nesse caso?

Silvana Francisca: Pode sim, caso não tenha um acompanhamento e atenção por parte dos responsáveis. As interações sociais são necessárias para o desenvolvimento saudável de uma criança. Se isto não ocorrer de maneira positiva, trazendo a redução da autoestima, sentimento de incapacidade e inadequação, não aceitação e não pertencimento no seu meio, a criança ou adolescente poderá não conseguir forças ou motivação para continuar seu processo de aprendizagem de maneira satisfatória.

A família tem uma função decisiva na percepção e no acompanhamento da rotina escolar e comportamentos da criança ou adolescente, facilitando a expressão de seus sentimentos e necessidades e construindo, juntos, formas de lidar com os desafios da idade, contando com a contribuição da escola nessa construção. O resultado, “mau desempenho escolar”, é apenas a ponta de um iceberg, sinalizando outras possíveis dificuldades vivenciadas, e uma delas pode ser decorrente de experiências de inadequação e desvalor como pessoa em suas relações, através do racismo.

DaquiBH: Além do mal desenvolvimento na aprendizagem e demais efeitos que racismo pode causar nas crianças, você consegue listar quais são os outros efeitos psicossociais do racismo?

Silvana Francisca: Os efeitos psicossociais causados pelo racismo na vida de uma criança negra estão relacionados, principalmente, ao preconceito e discriminação social. Entre eles, podemos citar a negação das próprias características, de origem africana; desejo e tentativa de modificação de suas características – como o cabelo crespo, sendo alisado – para se adequar ao padrão eurocêntrico (muitas vezes, fortalecido pelo núcleo familiar); identificação, principalmente, com pessoas brancas e seus hábitos; medo de se posicionar diante de situações de racismo.

DaquiBH: Na sua opinião, quais seriam as melhores metodologias a ser aplicadas dentro das instituições de ensino para que a educação antirracista funcione de forma efetiva?

Silvana Francisca: Para que haja efetividade na construção de uma educação antirracista, todo o processo precisa ser construído de forma conjunta, a partir do diálogo da escola com as famílias, comunidade, sociedade civil e alunos, identificando as formas pelas quais vivenciam o racismo e criando estratégias de ação que promovam efeitos reais e efetivos, incluindo um plano preventivo, passível de ser atualizado de forma dinâmica.

A escola precisa adotar medidas de valorização da história e contribuições dos negros em diversos aspectos como inovações científicas e tecnológicas, produção de conhecimento em matemática, química, português, entre outros. Incluir mais pessoas negras em funções de liderança em seus quadros funcionais. Promover um novo olhar sobre a história, diferente do que é mostrado nos livros, apresentando como o povo que foi escravizado não se submeteu às violências sem resistência e luta, re-existindo. Neste intuito, é fundamental que se promovam práticas que façam cumprir a lei 10639/03, que inclui nos currículos escolares o estudo da História da África e do povo africano, além de sua cultura, práticas religiosas e contribuições na formação da sociedade nacional.

DaquiBH: Estamos em um cenário de pandemia, e com isso as aulas presenciais deram lugar ao ensino remoto. Você acredita que mesmo as aulas acontecendo a distância as crianças não estão imunes de sofrer racismo virtual? De que forma isso pode acontecer?

Silvana Francisca: Sim. Em toda situação em que há interação social, existe esta possibilidade, tendo em vista que as pessoas se relacionam, em qualquer contexto, trazendo seu sistema de crenças e pensamentos. Com as crianças não seria diferente. Elas podem sofrer racismo em vários momentos, pois continuam se comunicando por meio de mensagens, quando há alguma atividade em grupo, ou apresentações verbais para a turma. O professor será um importante mediador neste processo, intervindo e adotando medidas de resolução junto à gestão escolar e às famílias.

DaquiBH: Qual é a melhor forma de educar uma criança que reproduz uma fala racista dentro da escola?

Silvana Francisca: Não existe uma maneira que se possa considerar como a melhor em todos os contextos. É necessário avaliar cada realidade, e promover a construção de outras falas para estas crianças, a partir do conhecimento do significado e efeito do que dizem, utilizando os recursos disponíveis, como histórias, vídeos, dramatizações, entre outros. Esta é uma das muitas oportunidades que o professor terá para abordar as relações étnico-raciais entre seus alunos, incluindo, sempre, as famílias em todo o processo. Assim, será possível promover a desconstrução de pensamentos e falas que reproduzem o racismo, para que sejam todos agentes de transformação, a partir do respeito e valorização das diferenças.