Por William Araújo
Quem imaginaria que o Buritis nasceu como um golpe do destino, desencadeado por uma série de eventos.
Muitos sabem, a fazenda deu lugar ao loteamento Buritis, que pertenceu ao químico industrial Aggêo Pio Sobrinho. Entretanto, não foi ele o responsável pela criação do bairro. Foi outro Aggêo.
Ainda, se você já se pegou pensando no motivo do local ter esse nome e não ter nenhuma árvore Buriti, hoje chegou o dia de descobrir o porquê.
O jovem Aggêo Pio Sobrinho
O jovem Aggêo Pio Sobrinho nasceu em 1902, em Dores do Indaiá, e veio estudar em Belo Horizonte quando tinha 14 anos de idade. Apesar da família ter o sobrenome Ribeiro, foi o único a ser Sobrinho por causa da homenagem que o pai fez a um parente e amigo farmacêutico, chamado Aggêo Pio.
Aparentemente, o jovem teve problemas e precisou voltar a Dores do Indaiá. Todavia, o repórter, professor e inspetor federal Dr. José Oswaldo de Araújo era amigo do pai do garoto e ficou sensibilizado com a situação, por isso, ofereceu custódia para que Aggêo voltasse a estudar na capital. Mais tarde, em 1938, o Dr. José viria a se tornar prefeito da cidade.
Aggêo voltou e estudou muito. Em 1921, concluiu o curso de farmácia na Faculdade de Medicina de Belo Horizonte; a partir de 1922, trabalhou como professor de Química Bromatológica e Toxicológica na Faculdade de Medicina de Minas Gerais.
Em 1925, concluiu o curso de Químico Industrial pela Faculdade de Engenharia de Belo Horizonte. Continuou estudando por muito tempo e virou cientista, mas vamos nos ater a essa profissão, que foi a divisora de águas na vida de Aggêo e do bairro Buritis.
Muitos amigos ilustres apareceram na caminhada acadêmica do químico. O professor Baeta Vianna foi um deles. Criou, com Aggêo, a fórmula do remédio Iodobisman, responsável por curar sífilis.
Na época, ainda não existia a penicilina e, por isso, o remédio virou sucesso no mundo inteiro, o que trouxe várias possibilidades a Aggêo. Inclusive, a oportunidade de comprar terras na zona oeste de Belo Horizonte.
Fazenda dos Tebaidas
No início da década de 1930, Aggêo começou a adquirir glebas na zona oeste de Belo Horizonte. Ao todo, comprou 19 pedaços de terra, os quais totalizavam, aproximadamente, 5 milhões de metros quadrados.
Os terrenos faziam divisa com as regiões do Olhos D’Água, Barreiro, Milionários, Cidade Industrial, Estrela D’Alva e a zona sul da capital. Juntos, formaram a Fazenda dos Tebaidas.
A Fazenda possuía uma sede onde fica, atualmente, o empreendimento da MRV que deu nome ao loteamento Buritis II. Em frente à casa, por obra do sr. Aggêo Pio, foi feito um grande lago.
Entre 1920 e 1940, dona Leocádia, uma farmacêutica casada com o sr. Aggêo, teve quatro filhos: Rubens, Carlos, Aggêo Lúcio e Paulo. Todos receberam o sobrenome Ribeiro.
A família morava no centro da cidade. Os filhos, como Aggêo Lúcio, foram criados nas ruas Guarani e Gonçalves Dias. Naquelas décadas, a Fazenda dos Tebaidas serviu a todos os parentes, que aos finais de semana se reuniam no lugar.
Dona Leocádia gostava muito de festas juninas e organizava várias no local. Aggêo Lúcio conta como teve uma infância maravilhosa na Fazenda dos Tebaidas.
O destino entra na história
Apesar da Fazenda ser um local mágico, uma série de acontecimentos culminou para que o lugar fosse desmembrado. Os primeiros problemas surgiram quando, segundo Aggêo Lúcio, houve a expansão da Cidade Industrial.
Algumas pessoas que habitavam ali entravam na Fazenda, roubavam ou matavam o gado e o descarnava no próprio local do abatimento.
De acordo com Aggêo Lúcio, outra região limítrofe, o Olhos D`Água, foi posse de Cândida Maria de Souza Guimarães no século XVIII e trouxe grandes problemas de invasão. Os herdeiros da senhora não sabiam quais eram suas terras e, por vezes, cercavam partes da Fazenda dos Tebaidas como se fossem suas propriedades.
A família precisou retirar várias vezes as cercas que estavam em local errado.
Em paralelo, com o advento da penicilina, o remédio Iodobisman ficou obsoleto e saiu de circulação. O Laboratório Iodobisman caminhou para o encerramento se suas atividades.
O químico, então, foi admitido pela Companhia de Seguros Minas Brasil, de seu amigo Dr. José Oswaldo de Araújo. Mas, cansado de tantos problemas, o sr. Aggêo Pio decidiu doar o terreno para a Santa Casa De Misericórdia.
Neste momento, houve a virada do destino. O filho de Aggêo Pio, Aggêo Lúcio, disse ao pai:
“Espera aí. O senhor tem quatro filhos. Deixe eles assumirem o problema”.
Com medo de perder parte da Fazenda, entre as décadas de 1950 e 1960, os filhos lotearam, às pressas, a área que fazia divisa com a Cidade Industrial, Milionários e Barreiro. Mantiveram apenas a região montanhosa, onde ficava a sede.
O espaço deu luz ao bairro Palmeiras e, segundo Aggêo Lúcio, o loteamento foi um sucesso tão grande que chegaram a vender 400 lotes em dois dias.
Contudo, as invasões continuaram no lado do Olhos D’Água. Além disso, o acesso à Fazenda ainda era precário e se mantinha pela zona oeste de Belo Horizonte.
Por isso, apesar da Fazenda dos Tebaidas ter um laranjal e nutrir a capital com mercadorias, os problemas se acumularam e levaram os filhos a lotearem o restante do terreno. Assim nasceu o bairro Buritis, por meio de um loteamento iniciado em novembro de 1976.
Guimarães Rosa e o bairro Buritis
Muitos pensam que o nome Buritis derivou da presença desta espécie de árvores no local. Entretanto, de acordo com Aggêo Lúcio, nunca houve um pé de buriti na região.
O nome foi dado por uma amiga da família e Secretária de Planejamento Urbano da capital, Dra. Ismaília de Moura Nunes.
Ela era apaixonada por Guimarães Rosa e, como o escritor era um amante das árvores Buritis, destacadas no livro “Grande Sertão: Veredas”, pediu, gentilmente, que Aggêo Lúcio homenageasse o autor.
Daí surgiu o nome do bairro Buritis, em novembro de 1976.
Trecho do livro “Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa.
“Pergunto coisas ao buriti; e o que ele responde é: a coragem minha. Buriti quer todo azul, e não se aparta de sua água – carece de espelho”.
No início, o empreendimento foi criado para assentamento unifamiliar (uma casa por lote), mas ficou estagnado muito tempo. O contrato formalizado com a Convap Engenharia e Construções, de acordo com Aggêo Lúcio, previa que a empresa urbanizasse o local em troca de 43% dos lotes obtidos.
Assim, nasceram as atuais avenidas e ruas do bairro. A av. Professor Mário Werneck recebeu o nome em alusão ao diretor da Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mas poucos sabem que o estudioso era amigo do Sr. Aggêo Pio Sobrinho e, por isso, foi escolhido para dar nome à via.
Quando a família Ribeiro fez o loteamento do bairro Buritis, precisou salvaguardar terrenos para que fossem mantidas áreas verdes. No entanto, destinaram uma parte muito maior do que a exigida à preservação, e dali nasceu o parque Aggêo Pio Sobrinho – o segundo maior de Belo Horizonte, com 600 mil m2.
O parque possui três nascentes que dão vazão ao córrego Cercadinho – alimentador da bacia do Rio Arrudas. O riacho recebeu esse nome por conta do bandeirante paulista João Leite da Silva Ortiz, que se estabeleceu por ali no início do século XVIII com uma propriedade rural, a qual foi batizada como Fazenda do Cercado.
O loteamento continuou com poucas casas até que a Prefeitura de Belo Horizonte, em 1992, mudasse o zoneamento da região, permitindo que fossem construídas residências multifamiliares. Nesse momento, houve o boom imobiliário do bairro Buritis.
De um ano para o outro, os prédios surgiram. Muitos, muitos empreendimentos aportaram no local, e as pessoas que procuravam um espaço próximo à zona sul de Belo Horizonte encontraram uma alternativa. O Buritis começava a ser o novo polo verticalizado da capital.
O letreiro “Buritis”, ideia de Aggêo Lúcio que indicava a região de loteamento do bairro, ficava no quarteirão entre as ruas Ernani Agrícola e Stella Hanriot, onde, hoje, existe o residencial chamado Key Biscaine. O prédio está na rua Stella Hanriot, número 515, e comporta no local uma quadra poliesportiva.
As escolas também ajudaram o Buritis a se desenvolver. Aggêo Lúcio é um grande amigo do missionário Raymond Herbert Meisenhalder, pastor da Igreja de Cristo, e cofundador da Escola Americana de Belo Horizonte (EABH) – na época, sediada no Izabela Hendrix.
Antes mesmo do loteamento, em 1970, os irmãos comercializaram parte do terreno para o pastor, que, posteriormente, assentou a EABH. Décadas depois, quando a PBH já havia mudado o tipo de zoneamento da região, outros institutos de educação apareceram, como o Colégio Magnum e o Centro Universitário de Belo Horizonte – UniBH (onde antes existia a Construtora Mendes Jr. S/A).
Daí em diante, o local atraiu muitos comércios, outras escolas e se tornou o que é hoje, o segundo mais populoso bairro de Belo Horizonte e o mais verticalizado da capital. Virou o que conhecemos como o bairro Buritis.
O Jornal Daqui BH agradece, carinhosamente, a Frederico Tôrres e Marcos Rezende, responsáveis pelo livro “Escola Americana de Belo Horizonte – 60 anos – Da memória para a história”, por terem fornecido os contatos para que tal reportagem fosse produzida.
Agradecemos, especialmente, ao sr. Aggêo Lúcio Gualberto Ribeiro por ter nos recebido tão disposto a compartilhar a história de sua família, da Fazenda dos Tebaidas e do bairro Buritis. Ele é autor do livro biografia “Não passei pela vida em brancas nuvens”, o qual ganhamos e é presenteado apenas a amigos.
Obrigado a todos que de alguma forma contribuíram com esse registro histórico.
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