Por Amanda Ferreira
Não é novidade que a indústria automotiva sofreu impactos devastadores com a pandemia, levando ao fechamento de muitas fábricas e concessionárias no Brasil. Mas, quais seriam as causas e as consequências desse cenário para a população?
Recentemente, a crise de fornecimento de matérias-primas colocou ainda mais pressão no mercado. A demanda está aquecida, enquanto a oferta não foi normalizada, o que agravou a situação. O resultado pode ser observado na constante alta nos preços dos carros 0 km no país.
Na maioria dos casos, a evolução dos valores cobrados pelos automóveis superou – e muito – a inflação oficial registrada no mesmo período pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pelo IBGE.
Um aumento considerável está justamente em um dos veículos mais vendidos nos últimos meses. A atual geração da Fiat Strada foi lançada no mercado brasileiro no meio do ano de 2020. Sua versão mais básica custava R$ 63.590, enquanto hoje o mesmo modelo não é vendido por menos de R$ 84.390, o que representa um aumento de 32,71%. Já a inflação oficial no mesmo período foi de 10,62%, três vezes menos.
O professor Anderson Cavalcante, subchefe do Departamento de Ciências Econômicas da UFMG, aponta algumas causas. “A Pandemia do Covid-19 afetou a produção e distribuição de insumos importantes da indústria, como semicondutores, o que gerou aumento de custos de produção e consequente aumento de preços. Com vendas mais baixas e aumento de custos, os produtores ajustam suas margens de lucro para compensar esses efeitos”, explica Anderson.
Segundo o professor, outros fatores também devem ser considerados, como o aumento do preço do dólar, que encareceu o aço, um componente essencial da produção e da redução da oferta de carros usados, que são substitutos, em alguma medida, de carros novos.
Além disso, os preços dos carros usados também estão nas alturas. A longa espera por veículos novos tem levado consumidores a buscarem alternativas, recorrendo aos seminovos, o que tem feito com que carros já rodados estejam mais caros do que exemplares zerados, dependendo do ano e do modelo.
É o caso da concessionária RPM Motors, também na zona oeste de Belo Horizonte. “O ano de 2021 já é o melhor ano de vendas de toda história do mercado. O difícil hoje é comprar um carro com margem pra revender, pois até quem não “vende carro” está vendendo pois soube do aumento e está aproveitando a onda,” explica Pedro Mota.
Quando a oferta excede a demanda, se o mercado é competitivo, a tendência é que os preços caiam, mas esse não aparenta ser o caso no país. É o que explica o economista Anderson Cavalcante.
“A pandemia gerou sérias restrições de oferta, o que a gente pode entender como a oferta menor que a demanda. Nesse caso, o efeito no mercado é um aumento de preços. Perceba também que estamos analisando como se o mercado fosse competitivo. Na realidade, são poucas as empresas que produzem carros e, em um mercado oligopolista, empresas operam com margens de lucro. Como as empresas lidam com reduções nas margens (por conta de aumentos de custos, por exemplo) é um fator importante na análise do aumento de preços”, alerta o professor.
“A indústria automotiva é um setor que gera muitos empregos (o Brasil está entre os maiores produtores de carros do mundo). Se a demanda por automóveis não reagir, o setor tende mesmo a operar com baixa capacidade, não conseguindo dar suporte a retomada do emprego”, explica Anderson.
Segundo o economista, o cenário também afeta o comércio internacional do país e, a depender da renda internacional, existem impactos sobre o saldo da balança comercial, reduzindo receitas no setor.
Não são só os consumidores reclamam sobre o aumento do preço nos produtos. “A alta no preço dos veículos nos afetou de forma negativa, pois não conseguimos mais repor nossos estoques e isso tem impactos diretamente no giro de vendas, que acontece com muito menos velocidade”, conta Wanderson Lima, proprietário e diretor financeiro da concessionária Alcance Motors, localizada na região oeste de Belo Horizonte.
Segundo o proprietário, durante o início da pandemia as vendas diminuíram muito, mas apenas três meses depois tiveram um aumento de 40%. “Agora enfrentamos outro cenário, pois sem estoque suficiente, as vendas voltaram a cair novamente. Por isso, estamos buscando veículos de todos os lugares possíveis do Brasil e investindo mais em reforma e recuperação”, pontua Wanderson.
Especialistas acreditam que não. “No curto prazo (próximos seis meses, um ano) não há expectativas de melhora. A economia não aparenta crescimento vigoroso; a melhora nos empregos está sendo concentrada em postos de trabalho com baixa remuneração e a renda tende a ficar deprimida com aumento de preços generalizados. Há expectativas de juros altos também para o próximo ano, afetando negativamente a demanda por financiamentos (importante para o setor). Então quando a indústria reorganizar a cadeia de produção e retomar a atividade, encontrará um cenário econômico ruim. Preços tendem a continuar altos”, observa o economista Anderson Cavalcante.
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