Por Amanda Ferreira
Imagine um vírus desconhecido que se espalha globalmente causando medo, sofrimento e mortes – e não estamos falando da COVID-19. Neste caso, é uma infecção incurável: o HVI. O que fazer diante disso? No Brasil, o Ministério da Saúde promoveu ações com os governos municipais e estaduais, realizou campanhas, firmou parcerias com organizações sociais e agiu para garantir acesso universal e gratuito aos medicamentos. Assim, aos poucos, o cenário de uma pandemia global passou a ser o de uma epidemia, mas que, ainda hoje, apresenta números alarmantes.
No dia primeiro deste mês, foi comemorado o Dia Mundial de Combate à Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), causada pelo vírus HIV. A data, celebrada todo ano desde 1988, no dia 1º de dezembro, foi estabelecida pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) e pela Organização Mundial de Saúde (OMS), como uma forma de conscientizar a população e alertar sobre a necessidade de prevenção.
Em especial, este ano marca os 40 anos da descoberta do primeiro paciente infectado pelo vírus no mundo. De lá para cá, muitas pesquisas e estudos realizados buscaram formas de conter a doença.
Segundo dados do Programa das Nações Unidas (UNAIDS), 37,6 milhões de pessoas vivem com a doença no mundo. Em 2020, 73% desse grupo tinha acesso ao tratamento antiviral, o que representa 27,4 milhões de pessoas. No Brasil, o Ministério da Saúde estima que aproximadamente 936 mil pessoas vivem hoje com HIV.
HIV E AIDS NÃO SÃO SINÔNIMOS
HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana) é o vírus causador da doença, AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) é a doença causada pelo HIV.
“A pessoa tem AIDS quando ela apresenta os sintomas dessa doença. Mas, 95% das pessoas que tem o vírus acabam a desenvolvendo, somente uma minoria, de 5% delas, parece ter uma proteção genética que confere a elas uma sobrevida muito grande ao vírus, sem o desenvolvimento da doença”, explica o médico infectologista Dr. Estevão Urbano
A transmissão do vírus ocorre por meio de relações sexuais desprotegidas, pelo compartilhamento de seringas, materiais perfuro cortantes contaminados e não esterilizados e através da transmissão vertical durante a gravidez, parto e/ou amamentação, quando não tomadas as devidas medidas de prevenção.
Segundo o infectologista, o que vai definir se esses 95% de risco alto para evolução clínica, para evolução sintomática, vão desenvolver a AIDS ou não é exatamente a disponibilidade de tratamento. “As pessoas que realizam o tratamento ainda portadoras do vírus e fazem o tratamento correto quase nunca vão desenvolver qualquer sintoma da doença. Por outro lado, aquelas que não tiverem vontade, ou acesso aos remédios, tem uma chance muito alta – geralmente cinco, seis anos após o contágio, de apresentar os sintomas da doença”, explica o médico.
OS TRATAMENTOS PARA CONTER O VÍRUS
Os medicamentos desenvolvidos nas quatro décadas de história do vírus possibilitaram que as pessoas ganhassem cada vez mais qualidade de vida. Afinal, a medicina consegue impedir que a imunodeficiência atinja níveis críticos, que gerem sintomas e impliquem na perda da qualidade de vida.
“Existe uma serie de tratamentos disponíveis hoje para HIV, todos eles baseados em antivirais. Eles são dados em combinação e geralmente as pessoas recebem dois ou três antivirais em combinação. Qual será melhor para cada pessoa depende de diversos fatores. Cabe ao médico avaliar a situação individual de cada paciente para definir qual a combinação que se ajusta e se adequa melhor ao caso. Lembrando que os medicamentos geralmente são os mesmos, seja enquanto o paciente é portador, para evitar o desenvolvimento da doença, seja para aqueles já doentes, para reverter os sintomas”, pontua o infectologista.
Com os tratamentos realizados corretamente, é possível evitar que mais pessoas sejam contaminadas. “O indivíduo perde a capacidade de transmitir o vírus. Quando ele toma todos os remédios e realiza o tratamento, consegue eliminar quase que toda sua carga viral orgânica, ficando nas suas veias, nas suas secreções sexuais, uma quantidade tão inexpressiva que acaba não sendo suficiente para uma transmissão”, explica o médico.
O infectologista ainda ressalta que, uma vez a pessoa tendo atingido uma carga viral baixa ou indetectável, ela tem que continuar o tratamento de forma resiliente, sem baixar a guarda. “Quando existe uma falsa sensação de segurança, e se para o uso dos medicamentos, ou toma irregularmente, mesmo aquela pequena quantidade restante no organismo é suficiente para, novamente, havendo uma multiplicação viral, atingir cargas muito maiores que vão ser deletérios para o paciente, pois aquela carga viral maior vai provocar não só o adoecimento do indivíduo, mas também facilitar a transmissão”, afirma.
Nesse cenário, o Sistema Único de Saúde (SUS) tem uma importância fundamental. “O Brasil é um dos países que tem uma das melhores políticas de controle do HIV. O SUS, universalmente, atende todos os pacientes, fornece as medicações necessárias de forma gratuita, confere atendimento médico, exames para as pessoas fazerem não só o diagnóstico, mas o controle”, finaliza o infectologista.
O AMPARO FORNECIDO AOS PACIENTES
Belo Horizonte possui uma rede robusta de infectologia. São cinco serviços especializados e oito farmácias ou Unidades Dispensadoras de Medicamento (UDM) responsáveis pela dispensação de medicamentos retrovirais para os pacientes que vivem com HIV.
A capital mineira ainda conta com dois Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA), que funcionam no formato de porta aberta ou sob livre demanda, onde fazem a testagem para infecções sexualmente transmissíveis, como o HIV, sífilis e hepatite B e C, além de realizarem orientações quanto à prevenção.
Além disso, todos os 152 centros de saúde oferecem essa testagem rápida para doenças sexualmente transmissíveis (DST), da mesma forma que os centros de testagem e aconselhamento.
Os Serviços de Atenção Especializada em Infectologia (SAE) atendem as várias doenças da infectologia, mas o foco principal e o maior volume também é o HIV. Além dos serviços ofertados pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), voltados para o combate e a prevenção, foi criado, no ano de 2000, o programa BH de Mãos Dadas Contra a AIDS.
“O programa, que já existe há 20 anos, é voltado para a sensibilização das pessoas quanto as infecções sexualmente transmissíveis, com um foco especial nas populações em situação de vulnerabilidade, em situação de rua, usuários de álcool e outras drogas, profissionais do sexo, pessoas transexuais e travestis”, conta a Coordenadora de Saúde Sexual e Atenção as DST’s de Belo Horizonte, Dra. Cristiane Hernandes.
“Todos os serviços especializados e os CTA’s possuem assistente sociais e psicólogos para a abordagem dessas pessoas no momento do diagnostico e também para aqueles com dificuldade de adesão ao tratamento. O paciente chega no serviço com receio de ter contraído uma doença sexualmente transmissível. Por isso, ele é acolhido, testado, e o profissional, seja ele o psicólogo ou a assistente social, tenta compreender qual foi a exposição, como a pessoa lida com a prevenção às infecções sexualmente transmissíveis, para, a partir dai, orientá-lo quanto a melhor forma de se prevenir”, explica a coordenadora.
O PRECONCEITO ENFRENTADO
Mesmo com tantos avanços e tabus sendo quebrados, ainda há muito a ser feito. “O preconceito sempre existiu e penso que existirá por muito tempo. É preciso atuar junto à sociedade, cotidianamente, para que mudem o olhar para as questões relacionadas ao HIV/Aids. As pessoas que vivem com a doença são vítimas de discriminação em muitos espaços, e ainda que velado, é percebido, seja nos olhares, nos gestos e nas atitudes”, conta Sueli Maria do Nascimento, Coordenadora de Projetos do Grupo Solidariedade, que atua em Belo Horizonte e na região Metropolitana.
O Grupo é uma instituição filantrópica que realiza ações de prevenção às infecções sexualmente transmissíveis, oferecendo oficinas educativas em saúde, artesanato, alfabetização e reforço escolar, grupos de autoajuda, atendimento psicológico e distribuição de insumos de prevenção.
“Os jovens e a sociedade, como um todo, precisam receber orientações e conhecer os métodos de prevenção. O HIV pode ser adquirido por qualquer pessoa. Prevenir é o melhor, sempre!”, alerta Sueli.
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