Os desafios enfrentados pelas mulheres que assumiram o banco do motorista e a desmistificação do preconceito
Por Larissa Kaliane e Victória Farias
O Buritis, segundo bairro mais populoso de Belo Horizonte, abriga 15.450 mulheres (52,6% da população total). Dentre elas, cerca de 67% estão em idade hábil a ter carteira de habilitação, segundo o último censo do IBGE realizado em 2010. A estatística pode dobrar se somarmos a essa quantia os homens em mesma idade.
A avenida Professor Mário Werneck, a principal via do bairro, perpassa o Buritis e recebe um fluxo de quase 15 mil veículos por dia em suas pistas. O acúmulo de carros no horário de pico é um reflexo da verticalização intensa que a região sofreu a partir da década de 1990.
De acordo com dados do Projeto Vida no Trânsito, entre o período de 2012 e 2014, ocorreram 719 acidentes fatais no perímetro urbano de Belo Horizonte. Em 2013, foram 231 vítimas fatais e 1727 em estado grave. Já em 2014 esse número aumenta, com 268 vítimas fatais e 1832 em estado grave.
Segundo a Secretaria, em toda Belo Horizonte, entre janeiro e dezembro de 2016, foram registrados 70.937 acidentes na capital mineira. Desses, 11.917 foram com vítimas e 59.020 sem vítimas.
Além disso, segundo a Prefeitura de Belo Horizonte, o perfil das vítimas de acidentes fatais é de homens e jovens entre 18 e 39 anos.
Maio Amarelo
Apoiado por várias empresas nacionais e internacionais, além de entidades governamentais, o movimento Maio Amarelo é uma chamada de atenção para a prevenção de acidentes de trânsito.
O evento foi criado pela necessidade de se cumprir um acordo assinado em 2010 pelas Nações Unidas onde se definiu o período de 2011 a 2020 a “Década de Ações para a Segurança no Trânsito”. O documento foi elaborado com base em um estudo da OMS (Organização Mundial da Saúde).
Uns dos principais pontos a serem evitados, segundo a campanha, é dirigir sob o efeito de álcool, o excesso de velocidade, não uso do capacete, do cinto de segurança e das cadeirinhas.
Mulher no volante, perigo constante?
É vasto o histórico de lutas das mulheres modernas por igualdade social. No entanto, a inserção delas no mundo automotivo ainda é alvo de julgamentos.
Andreza Pires Teixeira, moradora do bairro Buritis, diz que as mulheres são mais cuidadosas no trânsito, mas a grande maioria desconhece sua capacidade de serem boas motoristas. Ela afirma conhecer muitas mulheres que desistiram de dirigir por terem algum trauma. Outras sempre tiveram alguém para dirigir por elas, o que as desmotivou entrar no processo de habilitação.
O preconceito enfrentado por algumas mulheres no trânsito é uma barreira que deve ser quebrada para se chegar a igualdade, diz Andreza.
Outro ponto de vista é o de Priscila Magalhães, motociclista e moradora do bairro. Ela percebe que os demais motoristas dão muito mais respeito quando notam que há uma mulher pilotando.
Segundo a psicóloga Natália Moraes, o preconceito com as mulheres no volante ocorre por conta de um conflito de gerações, em que houve uma drástica mudança no papel da mulher na sociedade e em sua forma de viver. Aquela que ficava mais tempo trabalhando em casa e cuidando dos filhos, foi às ruas e decidiu trabalhar fora, quis conhecer o mundo e manifestar seus talentos dentro sociedade, isso gerou uma mudança e, consequentemente, o preconceito.
Natália fala que nessa linha de pensamento conseguimos entender esse preconceito como uma forma de afrontamento à liberdade da mulher.
Quando alguém escolhe algo diferente da expectativa que as pessoa tem sobre ela, gera resistência, raiva e intolerância. Esses fatores podem levar uma pessoa à sérios problemas de transtorno mental e agravação da saúde psíquica, diz a psicóloga.
Conquistas históricas
A Duquesa d’Uzérs foi a primeira mulher da história a conseguir uma carteira de habilitação para carros, em 1898, na França. Entretanto, ela também foi a primeira a levar uma multa por excesso de velocidade, por andar a 15km/h, quando a velocidade máxima nas ruas parisienses era de 12km/h.
A alemã Bertha Benz, a primeira mulher a fazer uma viagem longa de carro e ser piloto de teste, é considerada a “mãe” do automóvel, pois foi a responsável pela popularização deste. Mesmo sem habilitação, Benz pegou um Patent-Motorwagen e realizou, com seus dois filhos, uma jornada de cerca de 104 km, entre Mannheim e Pforzheim, na Alemanha.
No Brasil, Maria José Pereira Barbosa Lima e Rosa Helena Schorling foram responsáveis pelo pioneirismo do carro. Schorling conseguiu sua habilitação em 1932 e, além de ser uma das primeiras brasileiras a dirigir, também foi a primeira paraquedista do país. Schorling também conseguiu a sua habilitação de moto em 1933.
Mulheres na corrida
Embora as corridas sejam um espaço ainda dominado pelos homens, as mulheres estão cada vez mais lutando por esse espaço. Umas dessas mulheres é a paulista Ana Beatriz Figueiredo, primeira brasileira a correr no máximo da categoria mundial.
Ana Beatriz corre pela fórmula Indy e foi a primeira mulher a vencer na Firestone Indy Lights, a única a vencer na Fórmula Renault e a única a conquistar uma pole position na Fórmula 3.
Quando se trata da competição NASCAR, Danica Patrick, nascida em Roscoe, Illinois, é a representação feminina nas disputas. Mesmo com a supremacia masculina, Danica conseguiu liderar 19 voltas e terminou em quarto lugar em sua primeira corrida Indianapolis 500.
Danica é umas das atletas mais conhecidas no meio da corrida, e estampa as capas das principais revistas dedicadas ao esporte.
Já na Fórmula 1, não há nenhuma mulher competindo atualmente.
Carro de homem, carro de mulher
A gerente comercial da concessionária Pacific Motors, no Buritis, Letícia Radicchi, assegura que não existem quaisquer diferenças de carros para os gêneros. Ela afirma que as mulheres têm preferência por veículos de grande porte, enquanto os homens optam pelas automóveis menores.
E quem aprende mais rápido?
De acordo com a Autoescola Classic, localizada na avenida Professor Mário Werneck, as alunas, normalmente, se saem melhor nos testes de direção por serem mais disciplinadas. Além disso, elas absorvem os comandos do seu instrutor e logo os colocam em prática, apresentando mais facilidade em receber aprovação na primeira tentativa.
Segundo Marcelo Ferreira, dono do Centro de Treinamento Dirigindo Bem – Sion – Medo de Dirigir, a maior demanda pelo aprimoramento da direção veicular vem das mulheres, com uma média de 65% a 70% de procura. Elas não dirigem mal, mas têm menos vergonha de pedir ajuda.
Muitas mulheres buscam por causa da falta de prática, pelo receio de passar vergonha enquanto dirigem ou, até mesmo, medo de estar no trânsito. Durante o treinamento, o aluno é atendido por um psicólogo e acompanhado de perto pelos treinadores, fazendo trajetos simples que envolvem a ida ao trabalho, para casa e outros lugares.
Mulheres, carro, ação!
Além de ser um meio de transporte, o veículo pode ser considerado um propulsor da independência. Hoje uma habilitação impulsiona o direito de ir e vir.
No cinema, uma das obras que ressaltam essa autonomia é o filme Thelma e Louise, de 1991, dirigido por Ridley Scott. O filme conta a história de uma garçonete de quarenta anos e uma jovem dona de casa. Elas decidem viajar de carro para fugir da rotina, mas no meio do trajeto encontram e matam um estuprador. Dali em diante, a quebra das rotinas se transforma em fuga alucinante.
O filme fala sobre a cumplicidade, luta pela liberdade e a importância do carro como um terceiro companheiro dessa jornada.
Saiba mais:
Especial Trânsito bairro Buritis
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Independente de sexo, o importante é a pessoa se esforçar por aprimorar a direção. Ocupar uma faixa só, não se distrair com celular ou outros objetos, usar a seta e tratar a direção de um veículo como uma atitude profissional independente de que o objetivo seja só ir à padaria. Importante é saber, também, que muitas pessoas, homens e mulheres NÃO TÊM CONDIÇÕES de tirar uma carteira. Nesse caso, podem pedir carona, taxi, uber, ônibus, mas nunca, nunca comprem suas carteiras pois essa incapacidade só tende a piorar com o tempo.